08 maio 2007

Beco da Índia

Beco da Índia - Início do séc. XX

A Índia, pérola do nosso imaginário, símbolo de riquezas picantes e sutras de Kama, careceu durante séculos de representação condigna nas ruas de Lisboa. Embora a ocupação imperial de Goa se tenha estendido de 1512 até 1961, só em 1948 o Império achou, a bem da Nação, dotar a cidade capital com uma ribeirinha Avenida da Índia. Entretanto o sub-continente subsistia por becos e ruelas, levando a que Gomes de Brito escrevesse, numa linguagem elegante e plena de estereótipos históricos entretanto revistos pelos estudos pós-coloniais:

“Lisbôa, de cujo porto se abalaram as armadas que conquistaram a Índia, Lisbôa, séde de uma epopéa mil vezes mais proveitosa ao mundo do que a que se gerou da ambição de um corso, tendo ao seu dispor a recordação de milhares de homens e de terras cujos nomes são de outras tantas glorias, outras tantas apothéoses para a historia da nação portuguesa; Lisbôa, se quis ter uma rua para o infante D. Henrique, teve que desapossar d’ella S. Thomé, se quis ter uma rua para Vasco da Gama, teve de conquistal-a ás lamas da Boa Vista, se quis um ridículo quadradinho para glorificar Luis de Camões, teve que deitar abaixo uns miseráveis casebres.

Emfim, ao conquistador de Goa, ao vencedor de Ormuz, depois de lhe deitar as cinzas ao vento, Lisbôa deu-lhe por homenagem a ruasinha estreita e escura onde o filho do grande Affonso d’Albuquerque edificou umas casas, e a Índia, a própria Índia, essa Índia, nossa perdição e nossa gloria, Lisbôa entendeu que o melhor destino a dar-lhe era um beco sem sahida; - o beco da Índia, na Rua do Convento da Encarnação!

Grande lição de historia Philosofica, encoberta em uma ironia pungentíssima, vibrada em hora de bom humor pela veia sarcástica de algum vereador de gosto, ao fadigoso lidar longincuo do velho Portugal.”

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