26 junho 2007

Parte II - O Jardim dos Namorados

Jardim aliviado @Adriano Lisboa


Este texto complementa o abaixo.

Com o jardim tudo se muda e continua Pastor de Macedo:

“E o passeio de S. Pedro de Alcântara, como então se dizia, desembaraçado das sombras dos suicidas que por largo tempo sobre ele pairavam, voltou a ser um sorriso despreocupado no monótono dia-a-dia de Lisboa, ao mesmo tempo que passou a ser o Paraíso dos enamorados talvez por causa de um labirinto que ali existia e que teve de ser demolido justamente para evitar certas cenas que ali se davam e que o leitor facilmente advinha.

E assim como o labirinto foi destruído em nome da moral alfacinha, também o zelo da autoridade, em nome dessa mesma moral que a muitos parecerá ridícula, pegou num guarda municipal (…) e colocou-o na parte inferior da escada de pedra que faz a comunicação entre os dois tabuleiros, para não deixar qualquer homem, fosse qual fosse, levantar os olhos quando alguma senhora descesse.”

Desculpem-me o sorriso…

Parte I - O Jardim dos Suicidas


Jardim carregado @Adriano Lisboa

Este texto completa-se com o que estará acima.

Ao lado direito do Elevador da Glória está o jardim de São Pedro de Alcântara, um dos miradouros mais celebrados da cidade, ponto de passagem obrigatório para turistas e curiosos. A Baixa Pombalina e as colinas orientais estendem-se ao olhar.

A meio do gradeamento que suporta o miradouro encontramos umas escadinhas de pedra que nos conduzem abaixo, ao jardim do poeta de , António Nobre. Aí encontramos alguns bustos e uma placa evocativa do poeta. Hoje parece um abandono.

Acredite-se ou não, este local foi vazadouro de lixos e de animais mortos (!) nos anos que se seguiram ao grande terramoto. Só em 1835, depois de atulhado por iniciativa da Guarda Real da Polícia devido ao cheiro nauseabundo que por aí pairava, se construiu o jardim, o qual encerra memórias de cenas trágicas e outras, talvez cómicas:

Das primeiras conta Luís Pastor de Macedo:

“(…) Mas ao passo que Lisboa desfrutava duma encantadora janela escancarada sobre si mesma e um jardim deliciosíssimo de copado arvoredo, dispunha também de um sítio esplêndido para a tentação dos suicidas. E essa aprazível e pitoresca varanda de parapeito de alvenaria com um metro de altura e com poiais de cantaria para que o visitante curioso pudesse sentar-se e gozar regaladamente o belo panorama, passou a ser procurada de maneira desenfreada por todos os desiluduidos que espectaculosamente queriam deixar este mundo.

E tantos foram ali os suicídios, tanto barulho se fez na Imprensa, tantos clamores subiram às esferas municipais, que a Câmara, já de posse da administração do jardim desde 1839, por resolução de 12 de Maio de 1864, mandou substituir o parapeito por uma grade, parte da qual pertencera ao antigo palácio da Inquisição.”

De suicidas se fartava a futura Rua das Taipas e assim se explica o súbito arrepio, frio e pastoso, que percorre a espinha do desprevenido mictante, que depois de uma noite de folia no sobranceiro Bairro Alto desce ao jardim e sem vergonha aí se permite aliviar os seus fluidos.

Bibliografia

18 junho 2007

Introdução

Lisboa - século XVII
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Este texto chega com atraso. Por direito estaria lá em baixo, no primeiro capítulo deste livro que funciona ao contrário, que sobe páginas em vez de descer. Chega adiado mas no seu tempo.

É do Padre António Carvalho da Costa, e foi retirado da sua monumental obra Corografia Portuguesa. Introduz o Tratado VIII, último do terceiro, e último, volume, intitulado “da cidade de Lisboa”, e é bonito:

“Da descripção Topografica da famosa, nobre, & opulenta Cidade de Lisboa.

A REGIA Cidade de Lisboa, Corte de Portugal, & Emporio de Europa, intentamos descrever, & ainda que merecia mais hum livro particular, que huma breve narração, procuraremos estreytar as suas grandezas, não deyxando de individuar as suas principaes partes.

Querem os Astrologos que esteja situada debayxo do Signo de Aries, & he justo que dominasse o primeiro dos Signos do Ceo a primeyra das Cidades do mundo. Está na latitud Boreal de 38. graos, 48. minutos, & na longitud de 12. Graos, na parte mais Occidental de Espanha, & em tão docil clima, que sem que a offendão os ardores do Estio, temperados com o vento Oeste, a que chamamos viração, com a vizinhança do mar, & com a frescura dos valles, não padece excessiva calma; sendo o Inverno ainda menos rigoroso, porque o Sol com a sua presença, quasi sempre livre de nuvens, & nevoas, & sem que nunca cahisse neve, o que se contará com prodigio; fica sendo o seu fertil terreno huma perpetua Primavera.

Procurou a Arte aperfeyçoar tantos beneficios da natureza, emmendando tambem alguns defeytos, que na desigualade de sete montes fazião a sua situação menos accomodada; porém ganhadas com suaves subidas aquellas imminencias, como estão coroadas de templos, & Palacios, formão hum perfeyto Antiteatro, deyxando lograr aos que entrão pelo Porto aquella bellissima vista, que se perderia, se fosse assentada a Cidade em huma planicie; & para tratarmos methodicamente das suas partes, descreveremos cada hum dos sete montes, sobre que se eleva esta Augusta emula de Roma.”

O relato é de finais do século XVII, de antes do terramoto que enegreceu as mentes. Lisboa era a Primavera perpétua, o clima ameno, era a Beleza do anfiteatro de colinas que encanta quem pelo rio entra. Lisboa era a primeira cidade no mundo, sob a sombra do primeiro signo, que a Roma se compara, e a que só Roma se compara.

Talvez ainda vivamos no Paraíso… e não o sabemos. Ou então, talvez não.

01 junho 2007

Garrett, o elegante

Garrett, desenho a carvão, atribuído a Sendim

No texto anterior mencionei Garrett, elegante, descendo a colina do Chiado até ao D. Maria. Encontrei no entretando a imagem garrida dessa elegância e não resisto, aqui está, pelas palavras de Norberto de Araújo:

"(...) Garrett, flamante de casaca verde e bronze com botões dourados, colete de piqué de grandes bandas, cintado e pernalta, calça côr de alecrim, peitilho e punhos de canudo, luvas côr de canário, gravata azul ferrete (...)".

Atentem na conbinação das cores. Confesso que os meus olhos se enchem de verde, não do da esperança, descabido no contexto, mas do outro, do da inveja...


Bibliografia e Imagem